quarta-feira, 24 de setembro de 2008

A Existência Como Encontro

By Jack Vettriano


"Escrever, pensar e ler. Fazer o caminho contrário é outra forma de percorrer o mesmo caminho. Habitualmente, leio, penso e escrevo. Mas a rotina é a rota da botina. Dar a rasteira na rotina, e escrever, pensar e ler. Escrever sem pensar, pensar sem ler e, então ler outra vez. Reler o relido."

Gabriel Perissé

http://www.perisse.com.br/


Quando meu pai faleceu, fez-se silêncio estranho. Escrever era-me necessário, assim como pensar, sonhar, relembrar e ler. A estranheza da naturalidade da vida está impressa nessas ações que movem mais directamente o espirito. Tentativas mundanas de minha parte de contactos extra-corpóreos ou metafísicos.

Todavia, a vida não tem muita magia. Tampouco desejo esta pseudo-magia espetaculosa dos dias actuais. Prefiro observar o caminhar de formigas quando tomo meu café com leite todas as manhãs e atormentar-me pelo facto de escrever idiossincrasias sem valor mesmo sabendo que o destino me é a não - lectura. Isto sim pode ser mágico. Passar incólume sem falar demasiadas asneiras egóicas. O silêncio me significa. Dignifica.

O facto é que meu pai, além de uma riqueza de lembranças elaboradas e recontadas em meu livro de alma quase sempre, deixou-me um pequenina biblioteca. Nela, encontro um primo. Um professor. Um livro seu. Com dedicatória e tudo, com vontade de encontros.

Por internet faço contato. Nos encontramos. Nos conhecemos ou nos deixamos próximos à possibilidade de sermos familiares ou amigos ou colegas ou existentes solidários. Seu trabalho como professor e escritor trouxe-me significados novos.

Professor Gabriel Perissé mobiliza minha vontade e me faz conceber a mundanidade da vida como a possibilidade de encontros. Minha existência sai ganhando fôrmas novas e eu sinto uma vontade ingênua de alardear facto tão corriqueiro aos quatro ou cinco ventos ( porque criamos mais um...). Eu leio Gabriel, leio seus rastros neste mundo, ele é Homem que deixa rastros.

A intensidade me constitui. E o caminho das formigas se faz a cada dia por paredes diferentes.

Meu pai apresentou-me a um parente enquanto eu o construía como um novo pai imaterial pra mim. Ainda posso ganhar presentes dele. E sua existência que cessou por aqui ainda é insumo para novos encontros.

A vida não é mágica. É dolorosamente bela, estranhamente misteriosa. Fere a cada instante e muda e irrompe.

Amo, cada vez mais, nada ser . Sou apenas uma vivente com encontros a existirem. E eu os faço.


Ler e Escrever

Ana Paula Perissé*

Todo mundo se quer artista
poeta
como se num fluxo divino
palavras decaíssem expulsas de paraísos interiores.
Escrever o impensável
o quê nunca foi lido se faz?
Não , não quero mais pairagens verdes
mornas
quietudes pastéis
a vida é também o último espirro
de um vivente
à deriva
largado
sem IR
e as lecturas que nos constituem enquanto artistas(?)
é abnegação de nossa genialidade
fake
para ouvir o som sutil
que se captura
Em Busca do Tempo Perdido.
Não quero poesias róseas de auto-ajuda.
Quero sorver a entranha da terra
através de relíquias
já escritas
ou detalhes mundanos
registros de experiências
sem sentido por hora.

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