quinta-feira, 14 de agosto de 2008

O Tempo da Ressonância Artística

La Fissure - Rene Magritte

Somos todos seres estranhos, aqueles que não se subordinam ao tempo do Novo Pai Chronos da hipermodernidade.

Resguardamos nossa singularidade mesmo à contemplação da vida intensa e efêmera de uma chama ou de um clarão de um relâmpago. E tais ressonâncias nos rodeiam, afetuosamente, em novas sensações, vontades, lecturas da vida.

Chama-me a atenção o desvario das pessoas que me cumprimentam enlouquecidas, acorrentadas pelo Novo Pai Chronos, como se se lhes fosse uma vergonha parar, sequer, prum minutinho de conversa jogada fora, um dedinho de prosa poética esquecida por um corre-corre de compromissos até mesmo imaginários com a necessária Rainha Soberana Eficácia-Monetária do modus operandi de hoje.

Perde-se o tempo da vida, aquele da emoção mais duradoura que pode brotar em sementes de amizades, amores, lecturas desdobradas em ação efetiva no real. Política.

Estrelas cadentes não têm hora para aparecer tampouco a natureza nos oferece artíficios de câmaras lentas, replays e estatísticas de des-aparecimentos.

Estrelas que caem a toda hora e são esvanecidas pelo não ver, cegueira acumulada de imagens iluminadas pelo nada-não-emancipatório. O nada que reproduz tão-somente o desejo de não-ser acumulando o tempo possível, o lazer, em circulação hipnótica por lojas, mercadorias e shoppings fechados à vida verdadeira de uma gota ainda por cair na calçada já molhada.

Corro o risco de ser-me inútil, desnecessária, não tornar-me rica, mas actora de meu tempo.

Cenário com vários actos, sem buzinas, histerias histéricas que encobrem o não -ver.

Tempo não linear, curvatura da mulher e do corpo do homem amados, territórios imensos a desbravar sem pressa.

Meu tempo é o acender de um fósforo e aquilo que minha memória lembra deste instante a queimar-me como o desejo de amantes que se encontram em instantes de eternidades, infinitamente íntimos do tempo e do espaço.

Experiência qualificada porque vivenciada em cada compasso.

Salvemos nossos intantes de vida não produtivos pela lógica neo-liberal para que o poema retorne com a força imemorial, o rosto de nosso amigo se abra em seu sorriso mais sincero e despreocupado, a arte desabroche em cada minuto mesmo que não gere resultados quantificáveis de alguma estatística perdida em fórmulas-simulacro de algo em que os pseudo-viventes acreditam, ingenuamente ou não.

Servidão voluntária?

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Freud de Havainas

By Frederico José, do Bistro das Artes, Teresópolis


À Ana Augusta Ravasco Moreira Maia


Nunca tive filiação teórica, apesar de alguns autores me sustentarem com argamassa sólida, as mais sutis e delicadas, é bem verdade, mas que me permitem manter-me em pé ( ou de ponta cabeça) com certa propriedade, ma non troppo.

A desfiliação neste caso é minha liberdade para pensar.

Sou frankfurtiana, benjaminiana somente por consaguinidade espiritual, flamenguista, kierkegaardiana, existenciliasta, tropicalista, Gustav Klimtiana, budista iniciante, Manoel de Barros barrista, sei lá mais o quê... Ou nada disso, mais, até mudar de idéia, pois "nem sempre sou da minha opinião" ( Paul Valèry)

Não rezar a cartilha de gurus teóricos não significa adotar um mix de pensamentos desbussolados, numa tentativa vã de abarcar o mundo das idéias com as pernas e se sentir o modernoso filósofo dos dias hipermodernos.

Dá um trabalho enlouquecido conhecer, ler e reler cada um com o olhar da ótica do atravessamento e da interpretação crítica emancipadora Semi-leitores não se permitem tal flexibilidade dolorosa e cansativa.

Não ter um altar teórico concede-me a liberdade de olhar e escrever no registro da suspeita e do assombro, cabe ao generoso lector escolher.

Escolhas com sustentação.

De que fôrma me é permitido avistar um homem com uma insinuação pictórica de um chinelo e chamá-lo de Freud com havaianas?

Heresias autopoiéticas.

Escolhas.

Hoje, não quero o cachimbo e o divã, quero a liberdade de iluminar, às escuras, meu olhar de vagante esteta e ética, à procura da forma e conteúdo fechando uma gestalt mesquinha ou magistral.

Escolha, mas não do sempre igual.

Escolha que exige sustentação. Luto para tê-las.

A psicanálise liberta, outras lecturas também. Por que não um atravessamento náufrago entre elas?

Uma proposta em aberto, inacabada como a vida que pulsa em nossas veias latejantes de sangue.
Ana Paula Perissé